Segue sentença na íntegra:
Leia também o resultado da decisão que afastou a prefeita Arlete Bitencourt do cargo. Clique no link REGISTRO HISTÓRICO.
"TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIAJUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMECOMARCA DE FEIRA DE SANTANA-BAJUÍZA TITULAR: DRª. ISABELA KRUSCHEWSKY PEDREIRA DA SILVAESCRIVÃ: ORLENITA Mª SILVA DE FREITAS
DPJ On line - Expediente do dia 10 de julho de 2007
OUTRAS - 521203-2/2004
Apensos: 532018-4/2004, 544752-9/2004, 1476596-0/2007
Autor(s): A Justiça Publica
Indiciado(s): Jose Ribeiro Da SilvaReu(s): Wedson Oliveira Da Silva, Armando Oliveira Da Silva
Advogado(s): João de Melo Cruz, João de Melo Cruz Filho
Sentença: O Órgão do Ministério Público do Estado da Bahia, através de sua Promotora de Justiça, respaldado no inquérito policial incluso, ofereceu denúncia contra JOSÉ RIBEIRO DA SILVA, WEDSON OLIVEIRA DA SILVA e ARMANDO OLIVEIRA DA SILVA, qualificados na exordial, apontando-os como incursos nas sanções dos arts. 159, §3º, e 211, c/c os arts. 29 e 69 do CPB. Relata a denúncia que no dia 24 de agosto de 2004, por volta das 15:00h, os denunciados Wedson Oliveira da Silva e Armando Oliveira da Silva, a mando do acusado José Ribeiro da Silva, seqüestraram José Eugênio do Patrocínio dos Santos, candidato a vereador e filho do vereador José Evangelista Correia dos Santos, rival político do acusado José Ribeiro, vulgo “Zelito Ribeiro”, e de Arlete Bitencourt de Castro, então prefeita do Município de Cícero Dantas / BA, e ex-madrasta do segundo acusado.Narra a inicial que o 2º e 3º réus estavam a bordo de um veículo tipo Saveiro, cor preta, ano 2000, quando renderam a vítima, forçando-a a entrar no automóvel, dirigindo-se para a localidade de Mocó.Na estrada deixaram a vítima amarrada em uma árvore e retornaram à Cidade de Cícero Dantas para abastecer o carro. Ao voltarem encontraram a vítima caminhando na estrada, recapturando a mesma.A vítima foi levada para a Cidade de Tucano, sendo mantido o primeiro contato telefônico com a sua família por volta das 18:37h, através do número 075 – 278-1803, referente à Câmara de Vereadores de Cícero Dantas. Nesta oportunidade, o 2º e 3º réus fizeram com que José Eugênio informasse ao seu genitor que havia sido seqüestrado e que a condição para a sua liberdade e preservação de sua vida seria a suspensão da sessão da Câmara ou a não cassação da prefeita.Quando os denunciados Wedson e Armando tomaram conhecimento que a condição estabelecida não tinha sido observada, ou seja, que a sessão tinha sido realizada e o afastamento da prefeita decidido, se dirigiram à Ponte do Rio Jacuípe, mataram a vítima por asfixia (estrangulamento), amarraram uma pedra ao seu corpo e o lançaram no Rio, a fim de ocultar seu cadáver.No dia 27 de agosto de 2004 o corpo de José Eugênio foi encontrado às margens do citado Rio.Depreende-se dos autos que a motivação do crime foi essencialmente de ordem política, tendo em vista que foi estabelecido pelos seqüestradores como condição para a preservação da vida da vítima a suspensão da sessão da Câmara de Vereadores no dia 24 de agosto, que julgaria o pedido de afastamento da citada Prefeita daquele Município, por volta das 20:00h.Em 28/08/04 foi decretada a prisão temporária dos réus José Ribeiro da Silva, Wedson Oliveira da Silva e Armando Oliveira da Silva, sendo presos apenas os dois primeiros, vez que Armando não foi localizado. Habilitação do assistente de acusação às fls. 302. A denúncia foi recebida em 16/09/04, fls. 251.A prisão preventiva dos réus foi decretada às fls. 252/254, em 16/09/04.O denunciado José Ribeiro da Silva foi libertado em 28/09/04, através de liminar, concedida no Habeas Corpus nº 32503-7/2004 .A audiência de interrogatório inicialmente designada para 29/09/04 foi suspensa em deferimento ao pedido formulado pelo então Defensor dos réus, fls. 304. Informações prestadas nas ações de Habeas Corpus de nº. 32503-7/2004 e 32507-3/2004 às fls. 366/367.Os réus José Ribeiro da Silva e Wedson Oliveira da Silva foram interrogados às fls. 371/373 e 374/378. Armando Oliveira da Silva não foi localizado, motivo pelo qual foi determinada a sua citação editalícia.Defesas Prévias apresentada pelo novo Defensor constituído, Bel. João de Melo Cruz Filho, às fls. 386/387 e 388/389.Citado por edital, o acusado Armando não compareceu à audiência designada sendo determinada a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, ex vi do art. 366 do CPP, fls. 429, sendo deferida a colheita antecipada da prova, fls. 429.Oitiva das testemunhas de acusação e defesa às fls. 480/497, 533/536, 666/676 e 683/684. Toda a prova foi colhida através de precatória, sendo ouvida neste juízo apenas a testemunha de defesa Jorge de Oliveira Soledade.Informações prestadas no Habeas Corpus nº 28729-2/2005 , impetrado pelo Bel. João de Melo Cruz, às fls. 694/697.Na fase do art. 499 do CPP o MP requereu a realização de diligências, fls. 699. A Defesa nada requereu.Cópia do acórdão proferido no Habeas Corpus nº 28729-2/2005 , que denegou a ordem requerida, à unanimidade, às fls. 714/716.Alegações finais do Ministério Público, do assistente de Acusação e da Defesa, respectivamente, às fls. 780/784, 785/786, 791/804 e 812/831. O Ministério Público ratificou os termos da denúncia, asseverando que a prova oral confirmou a autoria e a materialidade dos delitos. A Defesa pleiteou a absolvição de José Ribeiro da Silva, alegando que não existem elementos probatórios que vinculem os atos de Wedson aos do delatado, inexistindo qualquer vínculo subjetivo entre ambos, requerendo a absolvição com fulcro no art. 386, IV do CPP.Em relação ao acusado Wedson foi requerida a desclassificação para o delito tipificado no art. 148 c/c o art. 211 do CPB, sob a alegação que o segundo réu não teve envolvimento nos fatos que ocasionaram a morte da vítima.É o relatório.
Decido.A materialidade está comprovada pela prova oral e pelo laudo de exame cadavérico de fls. 196/197.Após o exame das provas constantes dos autos resta inequívoco que os réus Wedson Oliveira da Silva e Armando Oliveira da Silva, seqüestraram José Eugênio do Patrocínio dos Santos no dia 24.08.04, com o objetivo de impedir a votação do afastamento da então prefeita de Cícero Dantas, Arlete Bittencourt de Castro, vindo a matá-lo quando tiveram conhecimento de que a sessão da Câmara havia ocorrido e a prefeita afastada.A vítima foi estrangulada e seu corpo lançado no Rio Jacuípe, preso a uma pedra, a fim de garantir a ocultação do corpo, que só veio a ser encontrado em 27.08.04. Embora esteja suficientemente evidenciado nos autos que o crime de seqüestro seguido de morte e ocultação de cadáver foi praticado pelos acusados Wedson e Armando, a responsabilidade criminal deste último não será analisada aqui, porquanto se encontra foragido, estando suspenso o processo e o curso do prazo prescricional em relação a este último.O acervo probatório demonstra que Wedson e Armando abordaram a vítima por volta das 15:00h, no dia 24.08.04, determinando que a mesma entrasse no veículo em que se encontravam, uma Saveiro preta, e ficasse abaixada, dirigindo-se para uma estrada vicinal conhecida como estrada do Mocó. Neste lugar, o réu Wedson, juntamente com seu comparsa, amarraram a vítima em uma árvore, saindo do local a fim de abastecer o carro, retornando meia hora depois, quando se depararam com a vítima na estrada, oportunidade em que a mesma foi recapturada.Após, os acusados se dirigiram para esta Cidade de Feira de Santana. No caminho, fizeram uma parada no Jorro para que vítima ligasse para a Câmara de Vereadores de Cícero Dantas e falasse com seu pai, avisando-o que não votasse no afastamento da prefeita, pois estava ameaçado de morte. Tal telefonema ocorreu por volta das 18:45h. Foi feita ainda uma outra ligação na qual a vítima falou com sua genitora através do telefone da Câmara, que informou que o seu pai estava na sessão.Ao chegarem nesta Cidade, os réus ficaram dando algumas voltas de carro com José Eugênio a fim de estabelecer novo contato com seu pai para saber o resultado da sessão, e conseqüentemente, se a condição colocada para a sua liberação havia sido atendida. Os réus levaram então a vítima para a BR-324, sentido Feira-SSA, por volta das 22:00h, e debaixo de um viaduto ligaram para o genitor de José Eugênio, oportunidade em que tomaram conhecimento que a sessão tinha sido realizada, e que o afastamento da prefeita tinha sido deliberado.Diante disso, o réu Wedson determinou que retornassem para Feira de Santana. No trajeto, antes do contorno, o acusado Wedson viu uma pedra de cimento, a qual foi carregada e colocada na carroceria do carro. Feito isso, eles passaram sobre a ponte do Rio Jacuípe três vezes, parando na quarta vez, quando após terem estrangulado a vítima, jogaram seu corpo no Rio Jacuípe, amarrado na pedra que havia pego, a fim de garantir que o cadáver afundasse.Consumados os delitos, o réu e Armando se dirigiram para a casa de Jorge de Oliveira Soledade, aonde pernoitaram tranqüilamente. Inexiste qualquer dúvida sobre o envolvimento do réu Wedson nos crimes. Ele seqüestrou José Eugênio pela motivação já aduzida, e, de maneira fria, executou todos os atos que levaram à morte da vítima, causada por asfixia obtida por estrangulamento, conforme laudo de exame cadavérico acostado, lançando após o corpo da mesma no Rio Jacuípe.O réu Wedson confessou o crime, fornecendo todos os detalhes sobre a sua execução quando ouvido na Delegacia, como se vê de seu interrogatório acostado às fls. 143/145.Em Juízo, o denunciado alterou sua versão, e tentou esquivar-se de qualquer responsabilidade pela morte da vítima, transferindo-a comodamente ao réu Armando, cujo paradeiro é ignorado.Tal retratação não se reveste de idoneidade e verossimilhança, restando claro que o acusado mentiu com o escopo único de atenuar as conseqüências do crime praticado. Observe-se que o réu foi ouvido na delegacia na presença de seu advogado e de seu genitor José Ribeiro, co-denunciado, não havendo qualquer evidência que tenha sido constrangido ou pressionado a confessar o crime. Muito ao contrário, tal interrogatório constitui peça processual idônea, isenta, porque obtida em fiel observância aos ditames legais, e apta a demonstrar a culpabilidade do denunciado no crime, e a verdadeira dinâmica dos fatos, harmonizando-se completamente com o contexto probatório, conforme se observa dos depoimentos a seguir colacionados:(...) Que por volta das 18:45 horas o declarante foi ao seu gabinete quando tocou o telefone, ao atender o declarante reconheceu a voz de Eugênio; que Eugênio disse que estava dominado por duas pessoas que estavam com um revólver e iriam “detoná-lo”; que o declarante perguntou se uma dessas pessoas era Zelito; que Eugênio respondeu que era o filho dele, Dinho; que nesse momento o telefone foi desligado (...) (JOSE EVANGELISTA CORREIA DOS SANTOS, fls. 494).(...) Que no dia 24 de agosto do ano passado por volta das 17 horas o depoente saiu desta cidade em direção ao Povoado de Trindade, onde reside lá, a fim de tomar banho para voltar para a sessão da Câmara de Vereadores; que ao se aproximar da rodoviária deste município passou pelo depoente um veículo saveiro de cor preta, em alta velocidade, dirigido pelo denunciado Wedson, conhecido por Dinho; que tinha outra pessoa com Dinho no veículo, mas o depoente não o reconheceu (...) que antes das 19 horas Evangelista recebeu um telefonema de seu filho Eugênio, vítima nesse processo, dizendo que dizendo que estava com Dinho e que iriam matá-lo se a prefeita fosse cassada (...) (JOEUDON DE CARVALHO SANTANA, fls. 490).(...) Que no dia da sessão da Câmara que afastou a prefeita o depoente trafegava pela BR 110, por volta das 17:40 horas, no sentido Ribeira do Pombal/Cícero Dantas quando cruzou por ele em sentido contrário, uma saveiro preta, em alta velocidade, fato este que chamou a atenção do depoente (...) (REINALDO CARDOSO DE SOUZA, fls. 485).O Defensor do réu Wedson, em sede de Alegações Finais, e na esteira de seu interrogatório judicial, requereu a desclassificação do delito, alegando que o réu não teve qualquer envolvimento na morte de José Eugênio e que teria cometido o delito dos arts. 148 e 211 do CPB. Invocou o defensor a tipificação do art. 148, justificando que a extorsão mediante seqüestro somente ocorreria, quando fosse exigida vantagem de ordem econômica, o que não ocorreu no caso sob apreciação, pois a motivação foi política.Da leitura do tipo penal do art. 159 resta claro que o legislador ao consignar “qualquer vantagem” objetivou não restringir a natureza da exigência formulada. De fato, seria absurdo que o agente seqüestrasse a vítima como ocorreu no caso sob apreciação, e em face da singela alegação da inexistência de conteúdo patrimonial, o ilícito fosse desclassificado para o tipificado no art. 148 do CPB, como objetiva a Defesa, cuja pena é de 1 a 3 anos. Neste sentido é elucidativa a lição de César Roberto Bittencourt:“O seqüestro objetiva obter qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate. Embora alguma divergência, o tipo penal não exige que a vantagem seja indevida, nem seja econômica. A natureza econômica é afastada pela locução qualquer vantagem, que deixa claro a sua abrangência. Quando a lei quer limitar a espécie de vantagem, usa o elemento normativo indevida, injusta, sem justa causa, etc. Assim, havendo seqüestro para obter qualquer vantagem, para si ou para outrem – não importando a natureza (econômica ou não) ou espécie (indevida ou não) - como condição ou preço do resgate, está caracterizado o crime”. (in Código Penal Anotado e Legislação Complementar, 1ª edição, RT, São Paulo, 1997. Também assim tem decidido a Corte Infraconstitucional:‘(STJ-170043) CRIMINAL. HC. EXTORSÃO MEDIANTE SEQÜESTRO QUALIFICADA. DOSIMETRIA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. ASPECTOS CONSIDERADOS NA SENTENÇA QUE NÃO SÃO INERENTES AO TIPO PENAL VIOLADO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. Não obstante o reconhecimento da existência de certa discricionariedade na dosimetria da pena, relativamente à exasperação da pena-base, é indispensável a sua fundamentação, com base em dados concretos e em eventuais circunstâncias desfavoráveis do art. 59 do Código Penal - hipótese dos autos. O tipo penal previsto no art. 159, § 1º, do Código Penal exige, para a sua consumação, apenas que o agente proceda ao seqüestro de pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate, por período superior a 24 (vinte e quatro) horas. Verifica-se que o mesmo delito poderia ter sido praticado sem quaisquer das circunstâncias levadas em consideração pela Magistrada sentenciante, de modo que a exasperação da pena-base não se revela abusiva, sobretudo porque restou fixada na metade da variação prevista no preceito secundário do tipo penal em exame, não obstante a longa permanência da vítima em poder do réu. Ordem denegada.’’ (Habeas Corpus nº. 54174/RJ (2006/0028243-0), 5ª Turma do STJ, Rel. Gilson Dipp. j. 12.09.2006, unânime, DJ 09.10.2006).Segundo ainda a tese esboçada pela Defesa o réu após saber que a prefeita havia sido afastada, decidiu soltar a vítima, deixando-a com Armando e dirigindo-se para a casa de Jorge, aonde pernoitou. No dia seguinte, quando foi buscar José Eugênio e Armando, encontrou o primeiro morto, tomando conhecimento que Armando havia matado a vítima durante a noite quando ela tentou fugir. O acusado então ajudou Armando a ocultar o corpo, jogando-o no Rio Jacuípe, após amarrá-lo numa pedra. Tal tese não possui lastro na prova obtida. Na verdade, a retratação apresentada por Wedson diverge de todo o contexto probatório, restando patente que se tratou de versão forjada, construída para ensejar improvável desclassificação do delito, evitando as conseqüências advindas da gravidade do crime cometido, seqüestro com resultado morte. O próprio interrogatório do co-réu José Ribeiro da Silva em Juízo alicerça a certeza da participação de Wedson na morte da vítima, conforme trecho a seguir transcrito:“(...) Que o interrogado confirma o que afirmou no seu depoimento na fase policial no que se refere ao seu filho Wedson ter afirmado que: “em sua frente e na frente de policiais, bem como de seu advogado que ora lhe acompanha, que havia seqüestrado a vítima em companhia de um rapaz, cujo nome não se recorda, tendo amarrado uma pedra em seus pés e junto com o outro lhe jogado no Rio Jacuípe”(...)”. Interrogatório de José Ribeiro da Silva, fls. 372/373.Ao ser ouvido em Juízo Wedson retratou-se, e afirmou que admitiu estar envolvido na morte da vítima por ter sido pressionado pelos policiais na Delegacia, inclusive com a notícia de que seu pai teria infartado, fls. 376. Ora, inexistindo dúvida que Wedson confessou o crime na frente de seu genitor e de seu advogado, figura óbvio que não só a versão apresentada em juízo é inverídica, como também as justificativas invocadas pelo réu para a sua confissão, a pressão dos policias, e o suposto infarte de seu genitor. Os autos demonstram todo o envolvimento do delatado no crime, não sendo possível, muito menos crível, excluir a sua participação na morte de José Eugênio, forçando a desclassificação do delito, inteiramente impossível diante da prova carreada.Observe-se que a confissão extrajudicial, quando espontânea e legítima, possui valor probatório incontestável, ainda que não tenha sido confirmada em Juízo, principalmente quando a nova versão apresentada colide frontalmente com a prova existente. Neste sentido é o entendimento dos Tribunais Pátrios:“A confissão extrajudicial, ainda que retratada em juízo, deve prevalecer sempre que estiver em consonância com as demais provas colhidas sob o crivo do contraditório. A chamada de co-réu e declarações prestadas por comparsa, inimputável à época do fato, deixam induvidoso que o apelante é autor do delito. Justifica-se a fixação da pena-base acima do mínimo legal quando os elementos antecedentes e circunstâncias do crime se revelam desfavoráveis ao réu e assim foram expressamente considerados pela sentença. Apelação criminal desprovida”. (TJDF – APR 20020410007784 – DF – 1ª T.Crim. – Rel. Des. Angelo Canducci Passareli – DJU 17.03.2004 – p. 44).“As provas produzidas durante a fase inquisitória têm valor probante, inclusive para embasar a condenação, se condizentes com os demais elementos probatórios carreados para o feito, sendo ineficaz, nestes casos, a retratação em juízo de co-réu que nas declarações extrajudiciais descreveu com detalhes a conduta ilícita dos três envolvidos. A fase informativa, como é cediço, não comporta contraditório e ampla defesa, uma vez que é procedimento administrativo. O reconhecimento de pessoa não está vinculado, necessariamente, à regra do art. 226 do CPP; portanto não induz nulidade se, dessa prova, e com base em indícios suficientes, motivou a decisão condenatória. Apelo que se nega provimento”. (TJAC - ACr 02.000719-1 - C.Crim. - Rel. Des. Francisco Praça - J. 29.11.2002).“Mantém-se a condenação quando a confissão feita na fase do inquérito, apesar de retratada em Juízo, está em consonância com os demais elementos probatórios colhidos durante a instrução, especialmente pelos depoimentos dos policiais militares, máxime se a retratação corresponde a versão inverossímil e fantasiosa. A presença de várias circunstâncias judiciais desfavoráveis não autoriza a redução da pena para quantum próximo ao mínimo legal”. (Apelação Criminal - Reclusão nº 2005.009180-0, 2ª Turma Criminal do TJMS, Amambaí, Rel. Des. João Carlos Brandes Garcia. j. 27.07.2005, unânime). Embora o Defensor tenha se insurgido contra a prova inquisitorial, certamente em razão de sua contundência, não logrou explicar o teor do interrogatório de Wedson. Não foi trazido pela Defesa qualquer elemento fático e verossímil suscetível de fragilizar sua confissão, ou ensejar qualquer dúvida sobre a sua credibilidade. Tal prova, juntamente com a oitiva das testemunhas, configuram o esteio probatório necessário para a formação do convencimento deste Juízo sobre a autoria dos delitos sob exame, já que o crime de ocultação de cadáver também restou provado, pois os réus esconderam o corpo da vítima durante algum tempo, jogando-o no rio amarrado a uma pedra, a fim de apagar o vestígio do crime.Dessa forma, não há que se falar em insubsistência de provas para a condenação de Wedson Oliveira da Silva. As provas colhidas fornecem ao Juízo certeza sobre a ocorrência do crime de extorsão mediante seqüestro com resultado morte e ocultação de cadáver. Todavia, a prova coligida não evidencia a participação do réu José Ribeiro da Silva no delito praticado. Não foi carreada qualquer prova que demonstre que ele tenha ordenado o crime, ou mesmo colaborado indiretamente para a execução do delito. Sua suposta participação não está caracterizada, o que impõe seja o mesmo inocentado da acusação.É sabido que o partícipe é o agente que, embora sem praticar ato típico, contribui para que o crime seja praticado, ou prestando auxílio material ou fornecendo suporte moral (induzimento, instigação ou comando). Desse modo, em relação ao concurso de pessoas é necessário separar os dois agentes distintos na realização do tipo penal. Aquele que efetivamente ingressa no tipo legal do comportamento ilícito, o co-autor, e o que o alicerça, de fora, de longe, indiretamente, a fim de obter a sua materialização, o partícipe. Para o reconhecimento da participação é imprescindível a presença dos seguintes elementos: relação de causalidade material entre as condutas desenvolvidas e o resultado; vínculo de natureza psicológica entre as condutas, sendo desnecessário o ajuste prévio; reconhecimento da prática da mesma infração e a existência de fato punível. No caso sob apreciação não restou caracterizada a presença do vínculo causal entre as condutas dos réus Wedson e Armando com eventual ordem proferida por José Ribeiro da Silva.Não se pode condenar, ainda que se trate do pior facínora, com base em suposições, indícios, ou presunções. É imprescindível a existência de prova cabal, incontroversa, suscetível de demonstrar, com segurança, o envolvimento do acusado no crime. Tal ônus probatório cabe ao Ministério Público, que lamentavelmente, não logrou demonstrar que José Ribeiro da Silva tenha ordenado que a vítima fosse seqüestrada e morta acaso a sessão da Câmara de Vereadores de Cícero Dantas fosse realizada, e a então prefeita afastada. O fato de terem sido trazidos indícios veementes de que a facção política liderada pelo denunciado José Ribeiro da Silva, é responsável, conforme depoimento de testemunhas, pela prática de uma série de ameaças e atentados reprováveis contra os parentes da vítima, e, também, contra outros políticos de ideais contrários da região, não é suficiente para demonstrar a sua participação no ilícito. Da mesma forma, as eventuais práticas truculentas, autoritárias ou coronelistas do acusado no exercício de sua vida política, embora sejam indicadoras de sua personalidade violenta e possam ser objeto de repúdio vez que descabidas e anacrônicas, também não autorizam, de forma alguma, uma condenação.“Existência de comprovação da materialidade do crime e indícios de participação do apelante no fato criminoso, ainda que insuficientes para condenar. Manutenção de sua absolvição, com fundamento no art. 386, IV e VI do CPP. 2. Manutenção da r. sentença por seus próprios fundamentos. 3. Apelação do réu improvida”.(Apelação Criminal nº. 2000.01.00.016373-8/PA, 4ª Turma do TRF da 1ª Região, Rel. Carlos Olavo, Rel. Convocado Guilherme Doehler. j. 07.02.2006, unânime, Publ. 17.03.2006. Frente ao exposto, e considerando o quanto consta dos autos, julgo parcialmente procedente a denúncia oferecida para CONDENAR WEDSON OLIVEIRA DA SILVA, reconhecendo-o como incurso nas reprimendas do art. 159, § 3º c/c o art. 211, todos do Código Penal Brasileiro, e ABSOLVER JOSÉ RIBEIRO DA SILVA, com fulcro no art. 386, VI do CPP. Em face do princípio da individualização da pena, inserido no inciso XLVI do art. 5º da Constituição Federal e aos comandos do art. 59 da Lei Repressiva Penal, passo a dosar-lhe a pena.O réu WEDSON OLIVEIRA DA SILVA não possui antecedentes, como se constata da certidão acostada, fls. 241. Não restou caracterizada a sua habitualidade na delinqüência, embora esteja evidenciada a reprovabilidade da conduta. A motivação do crime foi abjeta. O réu seqüestrou a vítima a fim de evitar o afastamento da então prefeita de Cícero Dantas, vindo a matá-la friamente quando soube que a condição para a sua libertação não havia sido observada. As circunstâncias também não o favorecem. Relatam os autos que a vítima após ter sido seqüestrada foi deixada amarrada em uma árvore, enquanto o réu e seu comparsa saíam para abastecer o veículo. Neste ínterim, ela conseguiu soltar-se, no entanto, foi encontrada na estrada, oportunidade na qual foi recuperada, o que indica a firmeza de propósito do qual o acusado estava imbuído, vez que não se constata que em nenhum momento tenha apresentado vacilação, insegurança ou remorso. A vítima ficou horas em poder do acusado, sofrendo cruelmente, pois ignorava se seria ou não sacrificada, além de ter sido submetida a intenso sofrimento psicológico, vez que a ela foi imposta a obrigação de contactar com o seu genitor para avisá-lo que não afastasse a prefeita, bem como para saber o resultado da sessão. Além do sofrimento moral, foi submetida a sofrimento físico, pois o laudo pericial indica que antes de ser asfixiada a vítima foi espancada, conforme as lesões descritas no laudo de fls. 196. A forma como o delito foi cometido realmente revela ser o réu detentor de profunda insensibilidade moral. O comportamento da vítima foi irrelevante para a prática do ilícito. Assim, analisadas as circunstâncias judiciais, fixo-lhe a pena base para o delito previsto no art. 159, § 3º do CP, em 26 anos de reclusão. Reduzo a pena em 1 ano, diante da atenuante da confissão espontânea. Inobstante a retratação apresentada, o acusado admitiu haver seqüestrado a vítima, confessando parcialmente o crime, embora tenha negado a sua responsabilidade na morte da mesma, o que autoriza a atenuação da sua pena, que fixo em 25 anos de reclusão. Fixo a pena para o crime de ocultação de cadáver em 1 ano de reclusão, deixando de aplicar a atenuante da confissão espontânea vez que incabível a redução da pena aquém do mínimo legal. Em face do art. 69 do CP, as penas deverão ser somadas, o que perfaz um total de 26 anos de reclusão, que torno definitiva à míngua de outras circunstâncias atenuantes ou agravantes, ou causas especiais de diminuição ou aumento da pena, a ser cumprida, inicialmente, em regime fechado. Inaplicável a pena de multa, vez que a Lei nº. 8072/90 ao alterar as penas do art. 159 do CPB, deixou de prever a pena pecuniária.Recomende-se o sentenciado na prisão em que se encontra. Ante a motivação já exposta, e nos termos da Súmula 9 do STJ, o réu não poderá apelar em liberdade.Custas pelo condenado.Após o trânsito em julgado, lance-se o seu nome no rol de culpados e expeça-se Carta de Guia, comunicando-se à Corte Regional Eleitoral, art. 15, III da CF/88.Interposto recurso, expeça-se Guia Provisória. Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Um comentário:
Amigo Gomes, estou interessado neste caso para um livro que estou querendo escrever. Se possivel, me mandar mais detalhes, textos, etc, ficalia-lhe muito grato.
grande abraço,
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